Estou Preocupado


Estou preocupado com as forma que vejo nos bancos da primeira fileira. Figurões, figurinhas estampadas em patifarias, risadas e gargalhadas. Competem umas com as outras. Mas, é só enganação. São divertidas, alegres, hilariantes. Brincam, sem sair do lugar.

Nas cadeiras, se não fazem bagunça, fazem chiado; somem por ali, aparecem acolá. Tem sempre algo novo a dizer o quer que seja. Por ora ou mais tarde acusam-se ao gabarem-se de sua estampa e de seus estandartes.

“Minha foto é melhor que a sua”! “Não a minha e melhor”! “Ah deixa disso! Vai ver a sua é melhor mesmo”! Não há contrariedade sem uma ironia de sortilégios e bajuladores que animam o lado mais forte. E de outro, é constante sentir o pesar de seus malabarismos atrativos. “Aquela ali é a que mais me compreende”. Moverão o mundo para combater os inimigos. “Não se assustem! A figura é todo-poderosa”!

O quadro


Sentada, ergue-se a coluna voluptuosa do desleixo dos quadris; e do finíssimo pé às coxas abertas que emudecem da cintura para cima. Levantou-se, debruçando seus cabelos encaracolados até a alça do colo por onde tirou a roupa do corpo para em seguida saciar seus seios em frente ao espelho e dançar carnalmente para dizer que é jovem, e é desejável aos olhos estranhos.

De um quadro a gosto lascivo ao horror maniqueísta (seita cristã de origem persa do primeiro século); quando mulheres não poderiam nem serem sonhadas assim senão como peça inquisidora. No tempo em que o homem era “santo” da cintura para cima, a mulher era um “demônio” capaz de armar ciladas e injúrias, desfazer alianças e esconjurar vigários. O espírito sátiro da forma humana com pernas de bode, orelhas compridas, chifres e cauda; seu retrato é a fina sintonia dos ideólogos de plantão. 

Quem orquestrou a farsa, sabiamente desfez o fio do teatro de dramaturgos, saltimbancos que o encarnavam em comédias ao prazer do riso enquanto suas vergonhas eram mostradas. Nada restou quando todo o poder da imposição sobre o corpo desmoronou em um turbilhão de filmes eróticos, e a pose das estátuas nuas antigas que em outros tempos foram destruídas.

O homem voltou a adorar a si mesmo?

FIM DE SEMANA

Penso na aula de sexta-feira. Corriqueira, doentia até não pensar nela mais.

Em um momento, finjo que sou um afortunado estudioso – um aprendiz da ciência que não sabe ao certo nem como se encontra a singela relação trigonométrica de Pitágoras.

Dirijo a outro assento, para ver se outro lugar poderia me tirar da incongruência. Não! Dessa vez, sou um escritor, outro aprendiz que mal aprendeu a andar sobre as próprias pernas. Não saberia os nomes dos grandes escritores, dos grandes cientistas, dos grandes entusiastas que talvez ensinem por seus trabalhos e memórias, ou o que sobrou num rabisco da cadeira, numa folha amassada. Serão fórmulas padronizadas de um tempo técnico e mercadológico.

Samba e pagode



A rodada de um pandeiro. Você viu que as mãos ágeis de um lado e de outro teimam nervosamente a bater. Os pratos ressoam naquele recinto. É um exercício filosófico; o que não poderia ser melhor para esquecer-se dos problemas do que uma música, um instrumento e um grupo empolgado com o que faz. É qualquer coisa que um instrumento de percussão dê a ser.

“Samba”... Não parece ser uma marca, produto de qualquer ideologia contemporânea, ou algo apenas de uma cidade que lembre o Corcovado e o Pão-de-açúcar, ou de qualquer outra parecida com ela. Antes a geografia do que a boêmia, peso ambos; terão um lugar para as inspirações de quem passeia pelas ruas e esquinas dos bares e quiosques.

Amanhã tomarei uma! Tenho dito. Se não aqui, em qualquer outra cidade que terá a decência de me servir uma cerveja. Se não der a cerveja qualquer água-ardente serve, e ver o tempo passar com as horas do sol de uma cidade calorenta.

O som será o mesmo, o de hoje até a madrugada, até o efeito inebriante findar. Mas, enquanto não acabar posso fazer os meus numa caixinha de fósforo e dizer que sou boêmio, que sou legal, que sou malandro como em algum clichê roubado de uma letra de Noel. 

A vida pode ser até agitada, se se pensar bem os encantamentos são suas nuances. Um deja vu de uma vida passada. O eterno malandro com seu chapéu panamá, terno e calça da cor de lã, com aquela cera no sapato preto saindo de um bar com os beijos de uma, esperando pela noite seguinte para findar num quarto sem as ceroulas. 

Teria tempo. Para andar ali e acolá buscando inspiração para cada acerto num jogo de cartas, ou no dominó, ou no bilhar, ou naquela mulher que faz a vida correr porque não teria sentido se as horas não fossem cobradas. “Amanhã eu pago!” “Não precisa!” “Como não precisa meu amor. Dou-te tudo o que precisar. Vem morar comigo”!